UMA CHANCE PARA O DIÁLOGO
Barbara Musumeci Mourão1
Em meio à preocupação generalizada com os conflitos que vêm contaminando relações próximas e distantes, em ambiente de tal forma polarizado que opiniões discordantes parecem ameaçar a própria identidade, têm sido ouvidas algumas referências à mediação de conflitos.
Ótima lembrança, pois a mediação se propõe justamente a restaurar comunicações corrompidas por desentendimentos, agregando novas possibilidades aos padrões binários em que os oponentes costumam se entrincheirar. Mais do que propiciar um acordo, a mediação ajuda a transformar divergências em alimento para relações mais frutíferas.
Evidentemente, não há milagres, mas a aposta nessa via tem produzido resultados auspiciosos, dentro e fora do sistema judicial, permitindo a solução pacífica de diversos tipos de conflito e proporcionando uma experiência potencialmente transformadora. De um lado, por exercitar a premissa de que interesses conflitantes não são necessariamente excludentes e refletem perspectivas distintas, em torno de uma mesma questão. De outro, ao reconhecer que por trás de um conflito há sempre um pedido mal formulado, que expressa uma necessidade humana. Não se trata, portanto, de negar ou exorcizar o conflito, mas de compreender suas demandas subjacentes e lidar com ele da melhor maneira possível: reduzindo e evitando danos, passados e futuros, e adquirindo, nesse caminho um repertório de recursos colaborativos, que sirva de alternativa à postura adversarial.
A mediação propõe substituir a noção de que para ganhar uma disputa é preciso derrotar alguém pela ideia de que é possível encontrar saídas de benefício mútuo para interesses contraditórios. Mais do que isso, a mediação opera uma noção de “consenso” que não significa concordância com o ponto de vista do outro, mas aceitação da possibilidade de uma visão diferente. Essa é a pedra de toque do trabalho. E ele começa por uma modalidade de escuta que permite desarmar pressupostos a respeito do outro, abrindo espaço para o reconhecimento da legitimidade da diferença. Quando isso acontece, o ponto de vista divergente deixa de representar uma ameaça que precisa ser rechaçada belicosamente e o diálogo respeitoso volta a ser um canal possível para a comunicação entre as partes.
Os benefícios da mediação ultrapassam, portanto, a formalização de um acordo, como sugerem os resultados da pesquisa do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, da Universidade Candido Mendes, realizada em dois Centros de Mediação da capital. Segundo o levantamento, mais da metade dos atendidos (56%) relatou ter encerrado o conflito com um acordo. Porém, a proporção dos que consideraram que a mediação valeu a pena e dos que a recomendariam a outras pessoas foi expressivamente maior (74% e 75%, respectivamente).
Se a mediação não for reduzida a simples estratégia para livrar o judiciário de seus 100 milhões de processos em tramitação e se, além disso, seus conceitos e práticas se disseminarem pelo tecido social, ela terá dado um contribuição valiosa para frear a intolerância, impedindo-a de contaminar todas as camadas do nosso olhar.
Uma nota: dos 215 entrevistados pela pesquisa, 83% avaliaram como bom ou ótimo o atendimento dos mediadores, 84% disseram que eles haviam compreendido suas questões e 92% se sentiram escutados de forma atenta e respeitosa. Não é uma boa notícia?